O que o tempo desfocou

Este tempo deve-te ter alterado. Alterou-me a mim ou antes retomei a minha vida sem contar contigo. Custa mas é possível. Racionalmente tento compreender o sucedido, embora sem fazer grande esforço porque há coisas que escapam ao entendimento, e a ferida aberta já começava a ser profunda. Tratei dela, continuo a tratar. Já não sangra, mói mais do que dói.
Talvez um confronto directo, que não desejo, me ditaria a verdade mas não anseio ver-te ou rever-te de novo. Não é isso. Mas no tempo em que convivemos mais assiduamente tomei uma parte de ti que começou a ser uma espécie de espelho de quem fui quando estávamos juntos. Não foi muito tempo. O suficiente.
Por mera curiosidade pergunto-me se estarás bem, se estás feliz. Ainda ontem te ouvi mas não te ouvia verdadeiramente. Porque estás desbotado. Mas não guardo qualquer resquício de rancor. Foi como tinha de ser e quando teve de ser. Foi tempo. Foi o destino ou o seu primo direito - o acaso.
Foi depressa. Foi abrupto. De repente enchias-me de promessas, outras faziamos planos. Sempre consciente que os fazíamos no campo do não realizável. Sonhos e esperanças que se desfizeram nas ondas de um mar salgado que certo dia correu sobre o meu rosto.
Este revivalismo é uma introspecção, vazio de significado sentimental. Não são saudades. É o acordar para a realidade. Para voltar ao dia-a-dia. Para usufruir de tudo o que esse dia me possa oferecer. Com mais uma experiência, mais um rosto e mais alguém que deixei entrar na minha vida de portas abertas mas que já não faz parte dela. E , inexplicavelmente, sinto um certo alívio. Respiro melhor. Inspiro e expiro este elixir que é a mágoa misturada com a força de viver.
Talvez sejam saudades de mim. Desse tempo recente em que acreditava e me enchia de esperanças. E depois enchia-me de tristeza. Insustentável.
A vida trocou-me as voltas e a única saída era afastar-me de ti. Quando me começaste a fazer pior do que melhor. Não quero ser radical. Não sei ao certo como será mas imagino pois apesar de ter passado pouco tempo sinto que consigo prever nas entrelinhas o desfecho. E já não quero mais. Estou cansada. Posso estar errada. Posso não estar. O coração diz-me que não será muito diferente do que imagino. Eu ouço-o.
Só para te dizer que não és reflexo de mim. Que hoje pensei em mim e por acaso em ti....